sexta-feira, 6 de junho de 2014

UM CERTO SORRISO


A vinda para Botafogo me fez mudar alguns hábitos. Eu que era daqueles seres compostos de cabeça, tronco e rodas, cada vez mais caminho para fazer tudo que preciso ou uso transporte público. Tenho até bilhete único e tarifa social.

Mas o que uso mesmo, com rotineira perseverança, é o Metro. Como, normalmente, posso fugir dos horários de pico,  consigo me locomover com conforto pelas entranhas do Rio. As aulas de Pilates no Largo do Machado, por exemplo, têm caminho certo. Dou uma andadinha até a estação de Botafogo, pego o Metro e fico em pé, normalmente junto à porta, já que vou sair na segunda estação e... Pimba!... Já estou no Largo, bem junto à igreja de Nossa Senhora da Glória e de lá é um pulo até o oitavo andar do prédio reformado.

Hoje foi assim também. Tudo correndo como sempre. Entrei no vagão e fiquei olhando as pessoas. Algumas ainda com um olhar distante de quem não acordou por inteiro, outras estudando, outras lendo, os mais antigos ainda levantam a cabeça e trocam olhares, os mais novos, mergulhados em seus mundos virtuais. Earphones, smartphones, Iphones, joguinhos, mensagens, great hits... Um amanhecer em bites.

Gosto de olhar também para os pés. Saltos altos. Sandalhinhas. Surrados tênis dourados. Agora está começando o tempo das botinhas e... Dos cachecóis. 

Estava perdida em meu universo de espectadora, voyeur desavergonhada, quando o trem parou na estação Flamengo. Foi uma paradinha rápida. Algumas pessoas entraram e quando as portas já estavam se fechando, uma senhora um pouco mais moça que eu, magra, vestindo jeans e um suéter listrado, deu um salto e conseguiu entrar no vagão. Foi a última. Seu salto foi seguido por um virar de cabeça quase em câmera lenta. Olhou,  com olhar de vencedora, para a porta que se fechava. Olhou e sorriu... Um sorriso de vitória... Só dela... Era novamente a menininha que chega ao céu na amarelinha. Era a adolescente que chegou tarde pela primeira vez em casa. A estagiária que apresentou o melhor trabalho e conseguiu o emprego... Rejuvenesceu.

Um sorriso... Só dela... Nunca podia imaginar que alguém a estivesse observando em seu momento de glória.

O sorriso se desfez ao solavanco da partida. Agarrou no apoio azul e respirou fundo. De repente tinha uma ruga na testa. Tinha outras rugas. Era ela de novo em seu rotineiro agora. Um rosto... Qualquer...

Só eu sabia que por instantes havia subido em um pódio particular. Vitoriosa e feliz. Por segundos, foi a mulher que sempre quis ser... 

A porta se abriu novamente: Estação Largo do Marchado!

Ainda olhei para trás e encontrei o seu rosto partindo... Havia envelhecido... Subitamente.

(in pblower-vistadelvila.blogspot.com)

Um comentário:

Eulalia disse...

Para mim, um de seus mais belos contos!!!