quinta-feira, 24 de março de 2011

UMA VISITA


Amizade é coisa que não se explica. De repente, no emaranhado da vida, surge um novo amigo, um reencontro, uma vontade grande de compartilhar. No fim de muito túnel, como luz que se esgueira, lá está um amigo. Naquela hora... A de precisão, desfrute, alegria ou puro desespero. Com um amigo, as coisas ficam sempre mais fáceis. Ficam melhores.

Leda veio me visitar ontem. Leda, amiga de minha mãe, que me viu nascer e crescer, veio almoçar comigo. Leda, que quando meus pais morreram, esteve ao lado todo o tempo, com seu olhar de advogada experiente. Naquele momento, fez o inventário dos dois, que morreram tão juntinhos, e me aconselhou, como faria com seus próprios filhos.

Fazia tempo que não a via. A última vez, foi no seu aniversário de 80 anos, há uns dois anos atrás. 

Foi um custo convencê-la de que eu podia ir buscá-la em Niterói. Não precisa... Eu vou de lancha e você me pega na Praça Quinze. E eu argumentando enfática, Nem pensar. Vou te buscar em Niterói. 

Quando cheguei, ela já estava pronta. Chique como sempre. Na última moda... Muitas pulseiras... Unhas, verde escuro. Foi bom revê-la.

Viemos para o Rio botando o papo em dia. Ela me contando de seus netos e filhos. De seu trabalho (Não advogo mais, mas faço serviço voluntário). E dos stents colocados, às pressas, no coração.

Visitou meu apartamento e me ajudou a tirar pela internet os últimos documentos para eu fazer meu imposto de renda. Não deixe para última hora não. Este final de semana, vou fazer o imposto dos meninos. Não gosto de deixar para a última hora.  (Meninos... Seus filhos, diga-se de passagem, todos mais ou menos da minha idade).

E, então, fomos almoçar. Conversamos sobre suas viagens, em especial os cruzeiros, e sobre sua idéia de ir à Patagônia. Na conversa, ela me lembrou que tinha visitado o Iraque em plena guerra, quando seu irmão servia por lá. Leda, você não teve medo?, perguntei. E ela, como que me explicando o óbvio, Era a minha oportunidade de conhecer Bagdá!

Fechamos o almoço, ambas saindo da dieta, com uma irresponsável fatia de torta de limão. Leda, seus filhos vão me matar! E ela argumentando como se estivesse no Fórum, É só hoje. Amanhã volto à dieta. Se eu soubesse a data de minha morte, três dias antes, comia uma rabada, depois uma camaroada e por fim uma feijoda... Rimos, cúmplices.

Foi um custo convencê-la de que eu deveria levá-la de volta a Niterói. Depois de uma enxurrada de Não-precisas, fui mais teimosa que ela e voltamos para Nikity sem parar de conversar. E aí ela me falou de seus planos e sonhos e de sua solidão. Só me arrependo de uma coisa, sabe. De não ter casado de novo. Os filhos estão criados. Têm sua vida. Eu devia ter casado de novo. Não me faltou oportunidade, mas eu não estava apaixonada. (Ela foi muito apaixonada, diga-se de passagem, pelo pai de seus cinco filhos. Advogado brilhante e briguento. Pedro... Sua grande paixão).

Chovia torrencialmente quando chegamos a sua casa. Quer entrar um pouquinho?... Não vai dar, obrigada.

Antes de sair do carro me disse: Não fique parada. Encontre algo para fazer. Que te dê prazer. Mas não fique parada. Eu sei que você ainda está chegando. Arrumando as coisas... Mas não pare...

Abriu a porta do carro e o guarda-chuva e correu para a portaria do prédio. De longe me jogou um beijo.

Amizade... É coisa que não se explica...

(in pblower-vistadelvila.blogspot.com)

sexta-feira, 18 de março de 2011

OS JARDINEIROS DO OCASO


Sou de uma geração estranha. Adolescemos em plena Guerra Fria e por anos tememos uma guerra nuclear. A BOMBA! A década já era a de 60/70, mas 45 ainda estava muito vivo entre nós. Éramos só modernos. A pós-modernidade, com sua falta de história e sua globalização, nem passava por nossas cabeças. E nem pesava sobre elas. Nossos inimigos tinham nome e sobrenome. Ainda acreditávamos em heróis.

Mas o tempo foi passando cada vez mais rápido, levando com ele o mundo e, a reboque, nossas vidas. A BOMBA! foi ficando cada vez menor e, de repente, virou quase estalinho. Os muros cairam. Agora todos se congraçavam em grandes negócios. E um dia, na década de 80, aconteceu Chernobil. Foi quando tememos, não mais o gesto belicoso, mas o acaso. O acidente. A incontrolável fatalidade. E voltamos a ter medo, apesar das inúmeras e assertivas afirmações de que a energia nuclear é limpa, ecológica, e a mais segura de todas. Podemos controlá-la... A não ser... Quando ela se torna in-con-tro-lá-vel. (Um terremoto gigantesco! Um tsunami colossal! ... Quem poderia imaginar?) 

Tinha medo... Tenho medo...

Quando aconteceu Chernobil, escrevi um poema... Quero relê-lo agora.

OS JARDINEIROS DO OCASO

(pelas vítimas de chernobil.
pelas vítimas de tokaimura.
por todos nós.)


jogaram sementes em terras de agosto
e não brotaram orquídeas
nem margaridas
nem parasitas –
brotou foi o chão

semearam assim
em meio ao firmamento
um óvulo a mais
no ovário da manhã
e não brotaram os frutos
nem a polpa
nem sementes –
brotou foi o chão
.........................................................

os jardineiros do ocaso
com seus dedos em estilete
plantejam sua erva daninha
ao acaso
em desvario
pelos pontos cardeais
atóis desertos estepes
rios ruas capitais
servem de solo perfeito
são seus surrados quintais

com seus rostos magnéticos
encobertos por crachás
tecem as patéticas rosas
nipônicas rosas de agosto
em nome da vida e da paz

antes
só se temia os botões
destas flores acromáticas
inodoras e assépticas
passíveis de florescer
possíveis porque reais


era o medo encubado
entre as estufas de urânio
era o medo encubado
entre o estrôncio e o caos
era o medo encubado
encubado e indizível
entre a fórmula e o fato
entre o feto e sua mãe


mas agora incontroláveis
florescem os rubros jardins
suspensos na atmosfera
a regarem com a sua seiva
a nossa seiva
o nosso sangue
a adentrarem as vísceras
a polinizarem de espasmo e espanto
nossas flores ancestrais

pobres pasmos jardineiros
sem respostas
sem razão
(a fórmula é fato
o fato está feito)
em seu medo de teóricos
com seus impotentes crachás
tentam colher os estragos
com plúmbeas luvas nas mãos

nem gardênias
nem ciprestes
nem um cravo –
brotou foi o chão

(in pblower-vistadelvila.blogspot.com)

sexta-feira, 11 de março de 2011

AINDA É CARNAVAL


Depois de quinze anos sem passar o Carnaval no Rio, o Rio e o Carnaval me pegaram, e me pegaram de jeito. Com amigos queridos, decidi curtir a festa e a cidade por toda a semana.

Foi passeio de lancha com direito a almoço "al mare" em itaipu, desfile de Escolas de Samba, blocos (apesar de só à distancia) e muito descanso.

Resultado: as noticias, histórias e impressões ficam para a próxima sexta-feira. ... Quaresma: tempo de reclusão e seriedade...

 Mas, por enquanto, ainda é Carnaval.



(in pblower-vistadelvila.blogspot.com)

quinta-feira, 3 de março de 2011

ESTATISTICAS


Uma coisa que eu adoro como administradora de um blog é ter acesso às suas estatísticas. Num apertar de botões, você cai em um mundo de gráficos, números, percentuais, além de ter várias informações técnicas que, para mim, não valem muito. Diante de tais hieróglifos, sou arqueóloga sem Pedra de Roseta.

A parte que mais me encanta é a chamada Público. Com atualizações imediatas, vou descobrindo, não só quantas pessoas me lêem, mas também, e aí está o grande barato, onde me lêem.

Ser lida no Brasil, na Venezuela, no México, nos Estados Unidos, no Reino Unido... me deixa super feliz, mas até aí eu entendo, tenho queridos amigos por essas paragens. Mas quando começam a brotar números referentes à Holanda, Suíça, Canadá, Alemanha, Austrália, a coisa começa a ficar emocionante. Até porque, mesmo contra a vontade de Silvio, continuo insistindo em escrever em português. Minha língua materna. Minha ferramenta mais precisa. Com ela consigo esculpir, com as outras, quando muito, faço uns ensaiozinhos muito pouco plásticos. Então, está bem, entendo quando abro o administrador e surgem leitores em Portugal.

Mas Japão! É uma surpresa daquelas! E Polônia... Rússia... Letônia!!! O máximo na semana passada foi uma visita do Irã!(?) Só pode ter sido erro de digitação. O visitante queria acessar alguma página para gritar para mundo seu pedido de libertade e ... Pimba! Caiu no meu blog! Imagino seu olhar (seria uma mulher?)... Por Alá! Que blog é este?!

Não faz mal. Tenho o registro. Alguém no Irã, por segundos, imagino, me visitou.

Acho isso fantástico. (Não sou uma digital native. Do alto dos meus 53 anos, ainda me espanto e me surpreendo com a tecnologia). Essa teia. Esses elos que se fazem e se desfazem. Um pedaço de mim poder estar em diferentes partes, em todas as partes, como poeira de estrela. [Isso é morrer um pouco... se diluir... Ser e não ser... And there is no question about it!...  Fernando Pessoa iria adorar este mundo! Já imaginaram quantos virtueterônimos ele iria criar?] 

Então, às vésperas do Carnaval. Na semana em que a cidade do Rio de Janeiro completa seus 446 anos. No momento em que a Cidade Maravilhosa se reencontra com a alegria de ir e vir... Dedico este texto a todos que me lêem por este mundo afora. Me lêem por carinho, amizade, curiosidade, ou mero acaso. Para essas pessoas, deixo de presente um pouco da cidade do Rio, com seu tórrido verão que, esta semana, já começou a outonar, com suas noites de lua cheia, com sua sinuosidade marota como um requebrado... Sejam bem vindos... E desfrutem... A cidade dispensa apresentações!














E que Ele... Meu amigo de tantos Carnavais ... Nos proteja sempre, com seu verde manto de mata atlântica.

Nota final: Não resisti e inclui um cantinho de Niterói... Afinal, foi ali que tudo começou... O meu ponto de partida...

(in pblower-vistadelvila.blogspot.com)