sexta-feira, 12 de abril de 2013

BORGES E EU




Como terminei meu curso de espanhol, fico, agora, à procura de oportunidades para hablar un poquito e o Club de Lectura ou, como o professor prefere, las tertúlias, surgiu como uma ótima opção. Tardes de quinta-feira, por todo o mês de abril. Ouvir, falar, discutir, aprender sobre Jorge Luis Borges.

O primeiro encontro foi muito bom, pois como o professor explicou, com o seu sotaque porteño entrecortado de algumas muitas palabrotas, é que se fala muito de Borges, mas há uma certa (grande?) distância entre se falar sobre obra e autor e, efetivamente, ler e saborear os seus textos.

Mas... Na verdade, este texto não é sobre o primeiro encontro do Club de Lectura. Este texto trata de outro encontro. Mais rápido. Mais efêmero. E profundamente impactante.

Rodrigo, o professor, começou a sua fala explicando como havia conhecido e se encantado com Borges. Puxou, então, do fundo de uma mochila (os professores de literatura continuam usando grandes mochilas e sandálias de couro!) um livro muito grosso, verde, que logo reconheci. BORGES OBRAS COMPLETAS.

Explicou que o havia recebido de presente de sua mãe quando ainda era muito jovem e foi com aquele livro que ele fez seus primeiros contatos com autor e obra.

Explicou que o havia recebido de presente de sua mãe quando ainda era muito jovem... E reclamou da dedicatória muito curta que ela havia deixado na folha de rosto.

Explicou que o havia recebido de sua mãe... Quando ainda era muito jovem... 

O encontro... Ou seria um reencontro?

O livro grosso e verde. Uma tarde de frio em São Paulo. Toma Patricia... Obras Completas de Borges... Acho que você vai gostar...

Mãe, eu não sei espanhol! Folheei o livro com desconforto. Tropecei por alguns poemas. Abri uma página ao acaso e Borges me segredou, com sua voz rouca e levemente gaga: Si las páginas de este libro consienten algún verso feliz, perdóneme el lector la descortesía de haberlo usurpado yo, previamente. Nuestras nadas poco difieren; es trivial y fortuita la circunstancia de que seas tú el lector de estos ejercícios, y yo su redactor.

O livro grosso e verde... Cheio de palabras e de intenções. Borges o seu redator e eu sua possível leitora... Naquela época, eu sonhava ser poeta...

Mãe, eu não sei espanhol!... Não faz mal. Um dia você vai aprender. Minha mãe era assim. Ariana. Determinava destinos.

Um dia você vai aprender... O livro habitou muitas estantes por muitos anos. Mais de quarenta. Às vezes, eu o abria ao acaso. Tropeçava por alguns poemas. Quando fui morar na Venezuela, foi um dos poucos livros que levei comigo. Aos poucos, o desconforto foi virando uma sem cerimônia entre amigos.

Aprendi espanhol. Ela disse que um dia eu iria aprender.

O livro grosso e verde... Não deixou para mim, em sua folha de rosto, qualquer dedicatória...

Mas... Toda vez que me perco em suas palabras, sempre me lembro daquela voz rouquinha de fumante inveterada que determinava meu destino de leitora... Não faz mal. Um dia você vai aprender.

Minha mãe era ariana e determinava destinos. Muitas vezes me disse que eu iria aprender. Não só espanhol, mas muitas outras coisas. 

Assim seja. Já estava determinado. Sigo em meu oficio de aprendiz. E, como artesã inexperiente, teço descobertas. A cada dia... 

E saboreio encontros e reencontros... Como esse... Entre Borges e eu.

Nota: O título deste texto foi usurpado de um lindo texto de Borges... Borges y Yo.

(in pblower-vistadelvila.blogspot.com) 

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