sexta-feira, 16 de setembro de 2011

CAROL


Não tive filhos... Mas tive muitos filhos espalhados por aí. Por salas de aula. Por encontros e acasos. Filhotes da vida.

Não tive filhos... Mas tenho alguns prediletos, que me encantam e me dão trabalho... Que me fazem feliz por existirem. (Já sou até avó emprestada!)

A vantagem de não se ter filhos é que seu ninho está sempre aberto a novas chegadas.

Uma vez escrevi sobre Dani Boy e também já falei de um Natal com o Gui...

Hoje é o dia de Carol.


Ela chegou para mim em uma visita de cair de tarde. Era frio e ela era tão pequenininha! Tinha três ou quatro meses e uma mantinha de lã cor de rosa e uma chupeta enorme.


Foi recebida com imensa alegria.


Depois... Ela já estava fazendo um ano. Parecia uma boneca em seu vestido de festa.

Foi crescendo em diferentes quintais. São Paulo, Icaraí, Itaipu.

Eu adorava quando ela, ainda bem pequenininha, ficava contrariada. Do alto de suas fraldas, botava as mãos para trás e, tal qual Napoleão, saia pelo corredor resmungando. Impropérios infantis e uma enorme chupeta perdidos em sua boca.


Sempre teve gênio. Coisa de geminiana.

O tempo foi passando e, às vezes nos víamos mais, noutras épocas, quase não nos víamos, mas teve um Natal...


1995. Meus pais tinham morrido e, no primeiro ano de perdas, algumas festas são só um calo, um nó, uma pedra. Celina me convidou para passar a noite de Natal com eles. Eu fui... Estava anestesiada... Ri, brinquei, cortamos o peru e, de repente, eu estava no sofá olhando para a televisão. Olho vidrado. Foi quando uma mãozinha de sete anos segurou minha mão. Não disse nada. Olhou para mim, nos demos um riso meio de lado, e ficamos as duas ali, olhando para a televisão.

Um salto e já eram as férias. Cristina veio de São Paulo com Denise e Cecilie e Carol ficou com a gente. Era praia de manhã e muita história inventada por mim em muitas tardes preguiçosas. Nós três sentadas na rede. Íamos pra lá e pra cá. Eu falando e Cecilie entrava num mundo de fadas e aventuras... (Que quando eu conto uma história, a criança vai comigo e faz parte do enredo. É personagem da trama. Enfrenta bruxa e pirata.) Cecilie se entregava de corpo de alma. Virava princesa... Carol era mais arredia. Desconfiada, às vezes me interpeleva, Tia, isso não existe...

E eu brincava, Carol tem 32 anos e é formada em biologia!

Foi nessas férias que Celina se separou e fui eu que falei com Carol que a separação  tinha se concretizado. Até pouco tempo atrás, eu levava comigo uma culpa escondida. Achava que tinha falado muito a seco com ela sobre o assunto. E foi só agora em janeiro, enquanto jogávamos conversa fora, que ela me eximiu da culpa. Respirei aliviada.


Neste mesmo dia, me contou que sua primeira recordação de mim era eu olhando para ela em plena crise de manha e dizendo, Não tem nada. É só manha. Não vejo lágrimas nos olhos. Ela riu e me disse que foi nesse dia que descobriu que os adultos podiam saber quando uma criança estava fazendo só manha e pirraça. (Não achei a recordação mais adequada, podia até ter provocado um trauma, mas que tenha servido de lição.)


Adolesceu como todas as adolescentes, com seus altos e baixos, suas crises existencias, suas insônias e inseguranças. Um dia pôs um piercing na língua. Quase a enforquei, mas mãe emprestada só pode fazer comentários... Sua louca!! Maluca!!! Detestei!! Se fizer de novo, vou bater em você!!! Essas coisas assim... Comentários...

Se apaixonou... Sofreu...


Eu sempre digo pra ela que um dia ela vai encontrar um rapaz chamado Gustavo e vai ser paixão à primeira vista.


Foi uma brilhante aluna de inglês e um dia me disse que queria estudar na Inglaterra. Tem investido muito esforço para isso.


Agora... O visto saiu... E ela embarca no sábado para fazer um MA em Marketing em Londres.

Carol cresceu. Todos crescem. A gente é que não repara. E agora começa uma nova etapa. Como um parto.



Que você seja muito feliz nesta nova fase. Descubra muito. Descubra-se mesmo. Faça muitas viagens. Aprenda. Relembre. Ensine. Cresça... Que encontre Gustavo, por acaso.

Mas sabe, nunca deixe de ser um pouco pequenininha. Pra caber de vez em quando em meu colo, quando você passar por aqui de visita.

Take care... Take risks... Take care!

God bless you!

Tia Patricia

PS1: Ah, e que La virgen de Guadalupe te proteja muito!



PS2: A foto que abre o texto é só uma lembrança pra você de que a vida é feita de luz e sombra. Curta os momentos de luz e aprenda quando ela faltar. Saber disso é importante para quem começa um mestrado.

(in pblower-vistadelvila.blogspot.com)













4 comentários:

Anônimo disse...

Pat, vc sempre me emocionando... linda, linda... Desejo q Carol encontre seu Gustavo e que seja muito, muito feliz. Sucesso para ela nesta nova etapa da vida. Bjks Simone

Celina disse...

Primoca, no momento só muita emoção e soluços. Você é imensamente responsável por toda essa trajetória.
No seu colo.

Carol Martins disse...

mas tia, se você pudesse me ver nesse momento não ia achar que é manha não! caramba!
Que eu continue sempre cabendo no seu colo, tia, mesmo depois de completar os 32 anos! Se hoje eu tenho um avião pra pegar é porque desde a época dos encontros esparsos em quintais aqui e ali você foi me ensinando (às vezes assim, sem querer, nesses momentos bobos que na hora a gente nem percebe, mas depois viram memória) que o mundo era maior que os quintais, e que havia formas de ir lá ver. E porque foi você foi me dando munição, esse tempo todo, de pouquinho em pouquinho. Mais do que munição, você sempre me deu e continua a dar EXEMPLO, a coisa mais importante que se passa aos filhos. E eu não vou continuar porque minha cara tem que estar razoavelmente reconhecível na imigração, né, não pode estar inchada! Obrigada, tia, por fazer parte da minha vida, e por me ajudar a construir a minha vida!

Alzira Willcox disse...

Não ouso fazer nenhum comentário. Seria como invadir um momento da mais absoluta intimidade familiar. Lindo texto!