sexta-feira, 17 de junho de 2011

IT RUNS IN THE FAMILY


Enquanto escrevo, do lado de fora dos janelões de vidro levemente manchado de maresia, os coqueiros da cidade de Salvador me observam.

Inverno em Salvador, com suas chuvas esperadas, suas nuvens gorduchas, vento, e quando se pensa que tudo está perdido, o céu teima em azular. Ainda que por poucos momentos.

À tarde volto à cidade histórica, ao Bonfim, à Conceição da Praia. Pela primeira vez me hospedo em Itapoã. Meu pai amava Itapoã e seu farol. Meus pais amavam esta cidade. Sofro de uma síndrome amorosa por esta terra que já me deu tantas, tantas alegrias. Amor enraizado... perdido em algum ponto de meu código genético. Como se diz em inglês... It runs in the family!

Esta semana foi deliciosamente corrida. Na terça-feira, voei para São Paulo para assistir a segunda palestra do ciclo Fronteiras do Pensamento e na quarta, já estava de novo voando para Salvador. (Quem disse que ia aguentar ser Local Vagabond... não me aguento e invento coisas).

Desta vez a palestra foi com Shirin Ebadi, advogada e ativista dos direitos humanos. Iraniana, exilada na Inglaterra. Prêmio Nobel da Paz em 2003. Sua palestra enfocou a situação da mulher no mundo e, em especial, no Oriente Médio.

A figura pequenina que se apresentou no palco encheu de energia cada espaço da Sala São Paulo. (Engraçado, tenho sempre a sensação de que quando as pessoas realmente acreditam no que fazem, no que vivem, no que pensam. Acreditam verdadeiramente em suas crenças e verdades, ficam maiores em tempo e espaço...).

A palestra em si, no entanto, não trouxe grandes novidades. Apesar de todas as lutas, as mulheres têm ainda um longo caminho a percorrer na busca da igualdade (?) Não, na apropriação de seus espaços. Quem disse que queremos ou precisamos ser iguais aos homens. (Somos melhores, não é?)


Houve um momento em sua fala que me chamou atenção. Não porque estivesse dizendo algo novo, pois todos, todas sabemos que as melhores replicadoras do machismo são as próprias mulheres com seu carinho e desvelo exacerbado por seus filhos varões. Mas ela comparou, em uma metáfora para mim inesperada, este comportamento supostamente positivo e carinhoso à hemofilia. É a mulher que carrega a informação genética, mas são seus filhos que desenvolvem a síndrome. E no final, todos sangram.

Ao sair da palestra, fiquei pensando em quantas metafóricas sindromes continuamos a legar para as próximas gerações. Todas correndo em nossas veias... (It runs in the family!). Intolerâncias, desrespeitos, o pavor às diferenças. Quantas vezes nos aproximamos de nosso próximo para afastá-lo no tranco. 

Vivemos o momento do preconceito ao preconceito e como podemos ser politicamente corretamente preconceituosos!

Continuamos a sangrar pelos poros da alma. Replicamos, repetimos... It runs in the family!







Foi uma pena que a Presidenta Dilma não tenha podido receber em audiência a Dra. Shirin Ebadi. Fico pensando o que terá impedido este encontro entre essas duas mulheres. Talvez uma agenda cheia... Ou quem sabe alguma questão politicamente genética, genéticamente politica... Quem sabe, uma rara síndrome tristemente (des)conhecida?

(in pblower-vistadelvila.blogspot.com)

4 comentários:

Valeria Genaro disse...

como sempre lindo, pat.
mae de 2 varões, como vc colocou, fiquei pensando cá c/ meus botões se estaria deixando escrito em seus genes alguma síndrome.
concordo q nós mães temos uma imensa responsabilidade em relação a essa carga "genética" a q vc se refere. mas não é justo deixar mais uma vez a maior responsabilidade conosco, mulheres. sempre nós...
(esse tb não seria um pensamento um pouco machista?)

pblower disse...

É verdade, Valéria... Novamente a culpa cai sobre nossas costas. Valeu o toque. Acho que o que vale mesmo é a nossa atenção e cuidado para não reforçarmos certas atitudes, de resto, é muito bom mesmo poder acarinhar aqueles que a gente ama. beijocas amiga

Eulalia disse...

É, Pat... leitura para pensar... muito!!!...

Celina disse...

Não tem jeito não, primoca. A gente sempre acaba passando algo pra frente. De bom e de ruim. Vá saber...
Às vezes na melhor das intenções...
Mesmo assim, uma família, na qual nos reconhecemos é tudo de bom, né?
Saudadinha.