sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

UM OLHAR ESTRANGEIRO


No Aterro do Flamengo há uma curva, na altura do Morro da Viúva, perto do Monumento a Estácio de Sá, onde imagens se encontram. Fez a curva e, a sua frente, o Cristo se apresenta sem pudores. Virou um pouco o olhar para um lado e lá está o Pão de Açucar... inteirinho. Se abaixar a vista, é a Urca, branquinha, que se mostra. E, se olhar para trás, ao longe, entre mar e uma certa bruma, está Niterói. Enfim, ali mora a beleza. Um conluio de cartões postais.

Desde adolescente, sempre me encantei com este lugar e, desde essa época, pensava como seria ver este ponto pela primeira vez. Me perguntava como um turista, um estrangeiro, veria a paisagem, porque, para mim, ela sempre esteve lá, como que a disposição.

Teve uma vez que experimentei, por osmose, este encantamento primordial. Foi quando Carla, a sobrinha do sul, veio me visitar e, justamente quando fez a curva, exclamou um prolongado: Tiiiiiiiiiaaa!!!! Não disse mais nada. Não precisava dizer.

No inicio desta semana, Silvio me convenceu a levá-lo ao aeroporto Santos Dumont bem cedinho. Tinha que pegar um avião para São Paulo... mais uma das muitas reuniões. Quando saimos de casa, constatei que era dia de casamento de viúva. Chuva ralinha e sol. Céu azulando no amanhecer. Descemos a Praia de Botafogo até o primeiro retorno para pegar o Aterro, justamente ali, na minha curva. Numa manobra rápida cai no Aterro e dei de cara com o Cristo. O Cristo e, bem a sua direita, vertical, como cajado, lança, cetro, ia se derramando um imenso arco íris. Pleno. 

Eu nunca tinha visto nada igual. Nem nos melhores momentos do Ávila. Como uma estrangeira, bem turista, gringa mesmo, me embeveci. Silvio e eu emudecemos diante da beleza da cena. Mas era manhã de surpresas e, até chegarmos ao aeroporto,  continuamos esbarrando em um monte de arcos íris que iam riscando o céu. Eu nunca tinha visto nada igual!

Engraçado, quando estava fora, tinha sempre uma câmera comigo para registrar momentos inesperados, mas aqui não. Eu, estrangeira por aqui? Nem pensar. Então, não preciso de máquinas fotográficas. Tudo já é conhecido... Perdi a oportunidade de registrar a indizivel beleza do acaso.

Acho que a gente faz isto muitas vezes na vida. Em nossa rotina, quantas vezes não deixamos de registrar inesperados momentos de beleza, as surpresas do dia a dia. Um carinho, um sorriso, uma boa gargalhada. Passa tudo batido, como paisagem já vista.

Por via das dúvidas, de agora em diante, vou sair sempre com uma câmera na bolsa e os olhos e o coração bem abertos... E uma alma estrangeira, de camisa florida, atenta a surpresas e encantamentos... Esses eventuais postais da vida. 


Nota: Como não pude fotografar o momento, para ilustrar o texto, busquei no Google a imagem mais adequada. Fiquei encantada com este quadro de Beth Gama (http://www.bethgama.ch). Um arco íris entranhado na montanha.

(in pblower-vistadelvila.blogspot.com)

3 comentários:

Celina disse...

Ticha querida,
Há muito que venho mantendo a camera na bolsa, pois meu olhar é sempre estrangeiro para essa vida cheia de surpresas. Mas às veses é surpresa mesmo, não só por causa da paisagem... é o olhar que está mais atento, mais sedento...como o seu!
bjs

Eulalia disse...

Querida,
O texto, em si, é um arco-iris!!!

A escolha da pintura... tudo!

E acho que, principalmente depois de anos fora, duvido que você veja essa cidade dentro da rotina... não você! Ter esquecido a máquina, acho que foi ato falho...(sorriso)... difícil de se repetir... (sorriso)

Re-benvinda ao que você sabe fazer de melhor: ser você!

Valeria Genaro disse...

Pat,
Em um livro azul com q davamos aula p o Diploma (lembra? rsrsrsrs) havia uma citaçao que guardei no coraçao ate hj. A autora era uma senhora q havia viajado muito e ela dizia: "Look, and look as much as you can, for you may never come this way again." Mesmo sem maq fotog, vc fotografou aquele momento.
Bjnhs.