sexta-feira, 5 de novembro de 2010

UMA TARDE


Fazia muito tempo que eu planejava passar uma tarde por lá. Talvez o nome da rua e a cor do muro não indiquem muito, mas, para mim, é como um espaço encantado. Lá o tempo corre em outra direção e há sempre uma certa brisa. Calle Londres, 247. La Casa Azul.

Já havia estado lá outras vezes, em visitas com amigos e também sozinha, mas passar uma tarde inteirinha no jardim da casa era aventura que eu nunca tinha vivido.

Não é que o jardim seja enorme, porque não é. E nem há plantas de tal ordem exóticas ou belas que possam nos proporcionar uma aula de botânica avançada. Não. O jardim é pequeno e se divide em pequenos canteiros com plaquinhas onde não está escrito o nome das flores, mas sim pequenas citações... frases ditas pelos donos da casa... Diego e Frida.


Cheguei no inicio da tarde. Tinha tomado o Turibus em frente ao Auditorio. Fiz baldeação em La Condesa e, depois de passar por San Angel e pela cidade universitária, cheguei a Coyoacan

Parei na praça principal, a do coreto, com seus bancos de ferro, sua igreja e  realejos. Queria ir caminhando até à casa azul. Queria meio que me perder naquela colonia. E não é que me perdi mesmo! Quando vi, estava no mercado popular, entre frutas, comidas, artezanato e muita roupa de monstro. Afinal, era quase véspera del día de los muertos, mas para a criançada pode chamar mesmo é de Halloween.

Fui tentando intuir o caminho certo e perguntando aos vendedores. Para se chegar à Calle Londres, tinha que passar pela Calle Paris. (Claro! Como não tinha pensado nisso?!)

O calor da tarde era forte e eu ia ficando cada vez mais com cara de gringa. Bochechas vermelhas. Mas, finalmente, cheguei.

Primeiro revisitei a casa e algumas lembranças de amigos que estiveram ali comigo. Havia um burburinho de muitas linguas ao meu redor. Francês, inglês e espanhol iam se misturando a sorrisos e comentários de tempos já passados. Reencontrei a cama, o fogão, os espelhos, a escada. Era bom estar ali.

Entrei por uma porta, sai pela outra e, de repente, o jardim. Árvores altas, sombra, muito verde se misturando ao azul forte das paredes. Um fresquiiinho... Queria ficar por ali. Bem quietinha. Mas onde? Como já disse, o jardim é pequeno e as únicas cadeiras estão em uma pequena cafeteria, mas eu não queria tomar nada. Só queria ficar ali ... por um tempo. Por muito tempo.


Acompanhei com o olhar um casal de americanos bem jovens. Típicos. Bermuda cáqui, sandália de couro e camiseta. Ela, com o cabelo amarrado num coque despenteado (coque que se faz para espantar o calor da nuca)  e ele de cabelo bem curtinho. Subiram uma escadinha de pedra. Eles e os meus olhos. E foi então que encontrei a desculpa perfeita para ficar por ali por mais tempo e também onde me sentar. Uma televisão, dessas de muitas polegadas, ia contando, em documentário, coisas da vida de Frida e de sua casa.

Subi e me sentei ao lado dos dois. Era bom estar ali. Fresquiiinho... Fui me perdendo nas imagens e na voz morna do narrador. E nem me encomodei com a tradução simultânea que a moça ia fazendo para o rapaz. Só queria ficar ali. Quietinha.

Depois de algum tempo o documentário acabou, eles foram embora e eu continuei sentada. Respirando. Olhava para um lado, para o outro. Me espreguicei. O documentário começou novamente. Outras pessoas se sentaram ao meu lado e eu lá... respirando... quietinha. Era exatamente isso que eu tinha planejado fazer. Passar uma tarde por ali. Naquele lugar fora do tempo e do espaço. Cercada de verde, árvores altas e um barulhinho de água caindo na fonte.

Acho que o documentário tinha começado novamente e na tela de muitas polegadas uma imagem me tirou de meu torpor...


Me tomei pela mão... Era hora de partir...


6 comentários:

Ana Schwarc disse...

Puxa vida! Será que eu, algum, dia terei esse privilégio!Maravilha! Conhecer a casa do casal! Esse ano, conseguimos ( eu e Eduardo) vermos a exposição em Berlin, por acaso! Pura sorte. E vc ai, heim! bjsss

Maria Elisa L. Cintra disse...

Nunca estive na "La casa Azul". Mas me senti passando a tarde lá, como voce. Gostei imensamente do seu texto.
Abraços, Elisa, (segunda à sua direita, na conferencia da Ingrid Betancourt)

pblower disse...

Elisa (segunda à direita) seja bem vinda ao blog. Que vc possa curtir bastante os textos. beijocas

Eulalia disse...

Qeu delícia!
Senti até o fresquinho!
Se inveja dessas não for pecado, juro que senti (sorriso).
Adorei o texto!
Beijinhos

Celina disse...

Você acabou de sair daqui e já estou com saudade. Só desculpo por que quando você está longe, tem essas deliciosas palavras para matar as saudades e passear junto com você.
Até!!!!

Elza Martins disse...

Patrícia, você é sempre assim, generosa, vivencia e nos deixa vivenciar suas descobertas. Obrigada.