Nicholetta adolesce em minha
varanda.
Nicholetta, neta de Lourdinha Carnaval.
E, como boa adolescente, tem seus momentos de tédio, profunda tristeza,
incertezas e mal disfarçada criancice.
Nicholetta se acha dona de seu nariz e, por causa disso, se esgueira em não me
toques. Não gosta de se expor. Fica num canto... Numa esquina da varanda. Ela e
seu silêncio de esfinge.
Se me aproximo, se encolhe. Não me dá ouvidos e nem muito papo.
Quando molhamos as outras plantas, neste verão infernal, dá de ombros. Agora
deu para fazer dieta. Diz que já tem muita seiva. Seiva até demais!!
E
resmunga que está muito cansada... Está sempre muito cansada. Então, nada de
fotossínteses. Está exausta para lidar com moléculas! E por falar em moléculas,
ela insiste e grita: Quem
inventou essa tal de química que me obriga a trabalhar!
Nicholetta
não é chegada a deveres, mas gosta bem de sonhar. Fica horas olhando o céu. E,
enquanto as outras dormem, se entretém buscando estrelas e se
entregando ao luar. De vez em quando dá um suspiro...Profuundo... Como se não
houvesse nada de bom nessa vida.
Nicholetta destesta samba. Prefere funk, hip hop e sei lá que mais.
Às vezes tento me aproximar. Trocar umas ideias... Quem sabe dar uns conselhos
de amiga mais velha, mas ela, que nada: Não precisa me dizer! Eu já sei
tudo!
Enquanto as outras cumprem o seu dever de
existir, Nicholetta quer arriscar. E, quando ninguém está por perto, estica o
pescoço e olha pra rua. Olha pra vida. Olha pro mundo. Queria ser flor de lis,
Maria Sapeca, trepadeira. Queria ser flor de maio. Flor da noite. Queria se
entregar a um cravo vermelho qualquer e virar erva daninha. Que a
vida é passageira e o importante é viver... viver... viver intensamente. Como
se não houvesse amanhã.
Então, foi com um sorriso mal disfarçado que a peguei na manhã de sábado passado. Sábado de carnaval. Ensaiando uns requebrados, meio que desajeitados. Tentativa e erro. Um rodopio, uma balançada. Como uma menina que treina seus passos de valsa no quarto, a portas trancadas, bem na frente do espelho. Seu reflexo como cúmplice. Ninguém mais.
Fiquei feliz. Muito feliz. Ainda que tímida e sem jeito, Nicholetta me lembrou Lourdinha em sua entrega à festa, em seu descabido e sábio despudor.
Naquela manhã de sábado, ela fez jus às origens e se apresentou a seu reflexo perdido no vidro da sala... Prazer, eu me chamo Nicholetta... Nicholetta Carnaval.
(in pblower-vistadelvila.blogspot.com)
2 comentários:
Lindo. Lindo!!!
Bem oportuno...
Ah se Nicholetta falasse... quem sabe gostaria de experimentar um recesso num inverno distante. E eu aqui, primaverescendo! Daffoldils e daysies por todos os gramados, assim espontaneamente!
Lurdinha é boa de prole, hein?!
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