sexta-feira, 31 de agosto de 2012

CUIDADO PEDESTRES! CUIDADO! PEDESTRES!

 
Quinta-feira, quase 10 horas da manhã. Avenida Presidente Vargas, perto do Saara. Vou atravessar a rua...
 
Há quanto tempo não venho ao centro da cidade! Muita gente. Muito tráfego. Vou atravessar a rua... Aquela massa humana, impaciente e aflita, vira uma espécie de geleia bem próximo ao sinal. Guardas municipais apitam. Os carros competem por espaços. Se esgueiram entre ônibus e frescões (será que ainda se fala frescões?). E a geleia lá, amorfa e ansiosa, para chegar, para sair, para voltar... O sinal fecha para os pedestres, mas ainda há um tempinho, um pequeno espaço antes que carros, motos e ônibus invistam contra nós. É o suficiente... O povo se atira na rua e atravessa. E corre entre os automóveis. Evita freadas. Os motoristas buzinam, reclamam. Os guardas apitam e os pedestres continuam. Fora da faixa. Fora de hora. Fora da lei!
 
Só eu e um senhor ficamos parados, esperando a nossa vez de atravessar. Esperando o sinal abrir para os pedestres. Esperando o homenzinho verde e caminhante nos dar a dica para continuar.
 
Se os pedestres fossem carros, fico imaginando, quantas infrações não seriam flagradas pelos atentos "pardais" que nos espreitam a cada esquina. Mas pedestre não tem placa... Alguns têm crachás... Outros, sequer identidade. Estão impunes em seu anonimato de carne e osso, sem para-choque, airbag ou cinto de  segurança. Pedestre arrisca a pele e o pelo... E seja o que Deus quiser.
 
Drummond tem um poema, lá dos idos da década de 20, um poema chamado
 
Cota Zero
 
Stop.
A vida parou
ou foi um automóvel?
 
 
Passei muitas aulas de literatura elucubrando sobre ele. Toda a sua força existencial, em um texto casual. Assim era a nova literatura. Com estrangeirismos. Sucinta. Rotineira... E, por isso mesmo, visceral.
 
Ali, tentando atravessar a Presidente Vargas e vendo aquela geleia geral furando o sinal, costurando entre carros, dando a mínima para as faixas de pedestres, me lembrei do poema. Pessoas banais, banalizando suas vidas para chegar a algum lugar... Sei lá qual...
 
E, de repente, a vida para, um carro para, ou um ônibus, uma van, uma bicicleta... Anônimos transeuntes das grandes cidades... Mais uns entre tantos... Mais uns entre tontos...
 
Pedestre também devia ser multado por infrações. Porque também as cometem, das mais leves às mais graves. E passam impunes... E passam em branco. Invisíveis... Até o carro não conseguir parar. Aí, viram cifras e continuam em seu anonimato feito de deseducação e falta de cidadania.
 
Texto antipático o desta semana? Não faço de heróis estes anônimos guerreiros que têm de matar um leão a cada dia para sobreviverem?
 
Não vou glamurizá-los mesmo. Só nesta semana já presenciei dois atropelamentos. Em um deles, a bicicleta passou por cima da moça. Bicicleta também é arma que mata! E todos estavam errados!
 
Fecho agosto, o mês das CPIs, greves e mensalões, pleiteando bom senso, civilidade e educação.
 
Abaixo os maus pedestres! Abaixo os maus motoristas! Abaixo a falta de educação!
 

Está bem... Semana que vem já vai ser quase primavera. E aí, talvez dê para eu falar de flores...
 
Por hoje, ainda agosto, mês de ressaca e fortes ventos, fica meu protesto e minha reinvindicação. Sejamos civilizados! Sejamos civilizados! Se não por civilidade, pelo menos que seja por preservação! 
 
(in pblower-vistadelvila.blogspot.com)

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

A MOÇA DA PRAIA DE BOTAFOGO

 
Era de manhã cedo. Manhã de dia azul e limpo. Dia seco, mas ainda com aquele friozinho da madrugada. Barulho de rotina e amanhecer. Buzinas. Mães apressadas levando os filhos para a escola. Os ônibus derramando gente sonolenta a cada parada. Os primeiros executivos chegando para o trabalho com suas malas de rodinhas, ideias e celulares de última geração. Um varredor de rua. Uma freada brusca. Os vendedores de frutas. As donas de casa com seus carrinhos de compras. Mais buzinas... E eu, indo para a ginástica.
 
Foi de repente que a vi. Parecia invisível entre todo o burburinho. Veio vindo em minha direção. Ninguém reparava nela. Mais uma das muitas pessoas apressadas, começando o seu dia. Mas ela chorava. Vinha caminhando devagar e, talvez por isso, eu tenha percebido que chorava.
 
Não estava vestida para chorar. Era morena, queimada de sol e usava um vestido curto e estampado. Fundo branco com flores. Chorava. E não disfarçava seu choro. Não usava óculos escuros. Veio vindo em minha direção.
 
Chorava um choro silencioso, desses que só as mulheres sabem chorar. As lágrimas escorrem pelo rosto. E mancham a maquiagem. E deixam os olhos vermelhos. Um choro que dá quase para se disfarçar quando a gente mente e diz que é alergia... Mas chorava.
 
Foi então que nos cruzamos e eu pude ver que era um choro chorado já há algum tempo. Os olhos vermelhos e inchados. Um soluço. Passou por mim e se foi.
 
No tempo real, não mais que uma fração de segundo, mas, de repente, o tempo parou e me perdi na pergunta. Por que aquela mulher invisível e anônima, caminhando pela Praia de Botafogo, chorava? Era cedo demais para já ter sido demitida de um dos escritórios de um dos tantos Centros Empresariais. Era cedo demais para já ter saído de um dos muitos consultórios médicos com um veredito de doença incurável. Era cedo demais... Era o inicio do dia... E aquele choro tinha cara de final de noite...
 
Imaginei a cena... Ela e o seu homem discutindo por toda a madrugada em dos muitos conjugados da Praia. Ele a teria traído. Ela o pegou no flagra. Quem era aquela outra de perfume barato? Ele, um pouco bêbado, desconversa e disfarça uma mancha de batom na camisa. Ela grita. Ela o empurra. Ele esbraveja. Se joga na cama. Quer dormir. Não quer falar. Ela fuma um cigarro. Ele nega tudo. Ele a empurra. Uma quase bofetada se perde no ar... O dia vai amanhecendo por trás do Pão de Açúcar e ela fuma outro cigarro e jura vingança. Ele resmunga deitado na cama. Não quer falar. Não pode falar. Sono. A língua pastosa. Ela chora bem alto novamente. Xinga. Canalha! Canalha! Jura vingança. Vai trepar com o primeiro... Com um qualquer... Ele se levanta e procura uma cerveja na geladeira. Ela não o deixa dormir! Ela chora e grita e reclama novamente... Até a bofetada acertar... Seca. Com o rosto queimando, vê a manhã chegar entre barcos na Enseada de Botafogo. O homem finalmente dorme. Ela está exausta... Quer respirar... Precisa respirar. Pega o primeiro vestido que vê. O que está na cadeira. Um vestido estampado, com flores e fundo branco. Sai do apartamento e bate a porta com força. Está exausta... Chora um choro silencioso. As lágrimas escorrendo pelo rosto. Os olhos vermelhos ardem com a luz forte do sol. Caminha pela Praia de Botafogo. Um dia vai se vingar... E nem nota aquela mulher que passa por ela indo para a ginástica. Não consegue pensar.
 
Quando me dei conta, estava em frente à academia. Ela havia desaparecido no emaranhado do trânsito. Foi então que me lembrei que hoje, justo hoje, Nelson Rodrigues faria cem anos...
 
Sorri da ironia do acaso... E saí de cena antes da cortina cair.
 
(in pblower-vistadelvila.blogspot.com)

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

E MAIS 10%

Cinquenta e cinco anos! E é como todo mundo diz... Passou tão rápido que eu nem vi! Meio século e mais 10%. Fico pensando em minha vida e vejo que foram, justamente, estes 10% (Não, os 10% e mais uns quebradinhos) que mais me ajudaram a aprender, a me divertir, a descobrir novos mundos, a ficar meio ranzinza, a ter saco para certas coisas e a me negar, peremptoriamente, a fazer outras.

Um tantinho só de tempo... Sete anos, talvez... E quantas histórias eu pude contar. Antes, eu às vezes ficava com os olhos meio que fechados. Tinha que trabalhar, produzir, fazer, fazer, fazer coisas. Não vou mentir, me divertia também, mas havia um quê de obrigação até no lazer.

Cinquenta e cinco anos... E este ano não vou fazer festa... Mas vou festejar... Festejar este estar viva e atenta. Festejar outras, novas, mais possibilidades. Festejar o gostar de estar em minha casa e ver de minha varanda o Pão de Açúcar... E sentir saudades do Ávila (a minha eterna montanha). Festejar o prazer de poder fazer um capeletti in brodo, não por obrigação, mas porque me deu na telha. Poder festejar o carinho dos amigos que já estão me ligando... E aí? Vai fazer alguma coisa no sábado?

Cinquenta e cinco anos... E como é bom ver a meninada (meus emprestados filhotes) crescendo, batalhando, abrindo seus caminhos e virando gente grande em um mundo que não dá trégua, não alivia. Às vezes eu olho pra eles, fico só olhando... E eles nem sabem que têm uma tia que gosta de olhar... Fico pensando quão fortes eles são... Pra enfrentar a competição desmedida e as exigências impossíveis... Metas... Metas... Metas...  Este mundo tecnológico e plástico, cheio de novidades e armadilhas... E eles estão lá, dando conta. Eles nem sabem o quanto essa tia se orgulha de todos.

Cinquenta e cinco anos... Quando fiz 22, me diziam... São dois patinhos na lagoa (Naquela época se dizia isso) E agora? O que são 55 anos? Dois cisnes navegando imponentes em um lago azul?

Que nada... São duas lagartinhas se preparando para entrar no casulo  e prontas para começar tudo de novo... Tudo... Até o salto maior... O de virar borboleta.

recomEÇAR... RecOMEÇAR... RECOMEÇAR!

No sábado, quando eu acordar, tenham certeza que pensarei em cada um de vocês, meus muitos e queridos amigos. Pensarei em cada etapa dessa vida que agora pode ser resumida em... Meio século e mais 10%!

Que muitos mais outros 10% me sejam presenteados pela vida... Pelo destino... Para que eu possa continuar contando as minhas aventuras e histórias. E amando, talvez e muitas vezes, de um jeito silencioso e desatento a todos os meus amigos.

E agora, me lembrando de meu avô... Aquele lá de Liverpool... Canto a canção que foi (e talvez tenha deixado de ser) a nossa tradição...  For she´s a jolly good fellow! For she´s a jolly good fellow...

Soprei a velinha e fiz o pedido...

Que eu continue sempre e por muito tempo a ser esta jolly good fellow. Companheira e amiga dos amigos, estes meus maiores presentes envoltos em papel de seda e atados para sempre com um repolhudo laço de fita.

(in pblower-vistadelvila.blogspot.com)

Nota: Foto retirada do Google images.

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

RECEITAS


Acordei com o barulho da televisão. Sempre me esqueço de colocar o timer. No jornal da manhã, a jornalista me informava que está na moda novamente o bolo, só bolo. Como ela mesma o definiu, "bolo sem sobrenome". Aquele bolo que a gente comia antigamente na hora do lanche. Bolo de mãe e de avó. Saidinho do forno. Bolo com furo no meio e no máximo um açuquinha salpicado por cima.

Bolo que, quando solava, deixava a cozinheira em profunda depressão e a criançada da casa exultante. Eu comia bolo solado escondido, porque me diziam que era ruim. Dava dor de barriga. Coisas de antigamente. Também não se podia comer o bolo ainda quente que fazia mal. Pois eu já comi muito bolo solado e quente e estou aí vivinha para contar minhas histórias.

Saudades... Saudades de bolos e de receitas que só minha mãe sabia fazer. Minha mãe cozinhava muito bem.

Quando ela se foi, me desfiz de quase tudo, menos de seus livros de receitas. Tudo escrito à mão e testado por ela. As receitas numeradas e avaliadas e, em uma ou outra página, uma planta de casa que ela iria construir. Minha mãe adorava obras.

Saudades... Saudades de tardes mormacentas. Ela, já aposentada, recostada no sofá, fumando, lendo ou vendo televisão. De repente dizia... Vou bater um bolo. Aquele rapidinho. E, em um passe de mágica, a casa se enchia de um perfume morno e doce. Mesa posta e café passado na hora. A gente sentava e ficava jogando conversa fora. Mordiscando fatias de bolo e conversas infindáveis. Muitos risos...

E tinha os dias de chuva e a casa cheia de primos. Às vezes era Itacoatiara, outras vezes, já era Teresópolis e ela dizia... Vou fazer biscoito de Ézinho. Quem quer me ajudar? E a tropa ia para a cozinha, enrolar a massa, comer da vasilha, implicar um com o outro, jogar conversa fora. Muitos risos...

Mas nada se comparava ao sabor dos pãezinhos de minuto que ela inventava de fazer porque eram fáceis e rápidos. Havia um ritual. Nunca enrolou a massa com as mãos para fazer os pãezinhos. Nada disso. Salpicava bastante farinha no mármore da pia. Por um tempo ficava aquela nuvem de pó. Quando eu era bem pequena, gostava de ver a luz passar entre a poeira da farinha. Era como mágica. Era quase um sonho. Salpicava a pia com farinha e depois abria a massa com rolo de madeira e, com a boca de um copo, fazia os pãezinhos. Uniformes, fofinhos.

Saudades...

Há sabores que se perdem no tempo e na língua. Já tentei eu fazer estas receitas e nada tem o mesmo gosto. Fica tudo faltando algo... Insípido... O bolo cresce, cresce... E eu uso o mesmo prato... E tento passar aquele café ralinho... Mas tudo fica insípido.

Talvez a farinha não seja mais a mesma. Talvez eu não dê pra cozinha. Talvez falte o burburinho das crianças ou aquela mistura mágica de fumaças... A do bolo e a do cigarro se mesclando no tempo. Na tarde. Talvez falte uma certa risada. E as invencionices. E aquele... Tem que deixar um pedaço pra Joe.

Saudades... Talvez seja o açúcar que não é mais o mesmo...

Talvez.

Mas, como sou uma eterna otimista, deixo a receita do bolo para quem quiser experimentar. Quem sabe, em alguma cozinha e em uma tarde qualquer, o sabor, aquele sabor, retorne a outras línguas e haja muita risada entre fatias e golinhos de café. Aí vai a receita. Ela o chamava de

 BOLO 1,2,3,4.

4 ovos (claras em neve)
3 xícaras de farinha
2 xícaras de açúcar
1 xicara de leite
200 gramas de manteiga
2 colheres de sobremesa de fermento

Bater o açúcar, a manteiga e as gemas até esbranquiçar. Ir colocando alternadamente a farinha e o leite misturado com o fermento. Finaliza misturando as claras em neve, sem bater muito para aerar a massa.

Forma untada e polvilhada e forno 180 graus.







Espero que o bolo fique bem gostoso e que se transforme em uma boa recordação. Ah... E não se esqueçam do café passadinho na hora. 

(in pblower-vistadelvila.blogspot.com)

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

DE TIAS, WHISKY E ACONCHEGO



Meus pais morreram muito cedo, mas me deixaram como um legado maior suas famílias. Desde criança, minha vida de filha única é povoada por tios e tias e primos e muitas histórias.

Duas tias têm um espaço especial nesta linha riscada na palma de minha mão. Linha da vida. Curvilínea. Às vezes, forte, intensa, grossa. Outras vezes, tênue, frágil, fina. Mas em todos os momentos, lá estavam elas, como presença e presente.

Tia Dorinha, a irmã mais moça de meu pai. É minha guardiã. Ai de quem queira mexer comigo. Ela vira bicho. Vira mãe. Quanto mais o tempo passa, mais fico parecida com ela.

Tia Helena, a irmã mais velha. A guardiã das mais antigas histórias da família. Memória invejável. Para nomes, lugares, quiproquós e eventos familiares variados.

Quatorze anos de diferença entre as duas. Entre a quase caçula e a mais velha, vieram quatro meninos. E depois, ainda teve mais um. Que vigor tinham meus avós!

Tia Dorinha continua morando em Niterói e, para profundo desgosto dela, tia Helena foi morar com as filhas em São Paulo. Mas ontem, as duas estavam juntas e eu decidi ir visitá-las. Matar saudades. Que coisa boa poder ficar lá com elas a tarde inteirinha. Batendo papo. E, aí, surgiram as histórias. Algumas já conhecidas, mas desta vez... Desta vez, teve algo completamente novo. Que história! E as duas juram de pé junto que é verdade!

Estávamos falando de coisas e, sei lá porquê, contei que ano passado, em Inverness, em pleno inverno, Celina e eu pegamos uma baita gripe (até hoje acho que foi essa tal de gripe A), mas enfim, passamos uma noite inteira tossindo e infernizando o sono de todos no Bed & Breakfast. Na manhã seguinte, além dos habituais scrambled eggs, baked beans and sausages, a dona do lugar nos serviu um montão de remédios, enquanto o escocês marido dela prescrevia com a confiança de quem sabe... Some warm whisky... You should have some warm whisky!

Foi o mote para Tia Helena emendar... Daddy sempre disse isso. Para tudo ele tomava whisky morno. De dor de cabeça a dor de barriga, passando por gripes e resfriados. Também, não é pra menos, ele sobreviveu por causa do whisky.

Aí, fui eu que dei um salto. Como assim? Vovô sobreviveu graças ao whisky?

As duas responderam em coro. Era isso que ele sempre dizia. Você sabe, né? Ele nasceu prematuro...

Além do fato de eu não ter a mínima ideia de que meu avô, aquele homem enorme da minha infância, ter sido um bebê prematuro, não podia imaginar qualquer relação entre ele e a bebida escocesa. Foi ai que elas me contaram.

Meu avô nasceu em Liverpool, lá pelos idos de 1890. Isto mesmo. Finalzinho do século dezenove. Nasceu de sete meses. Meu bisavô era médico, então o bebê foi colocado em uma caixinha, tipo caixa de sapato, todo envolto em algodão. (Estou contando a história, como me passaram.) Envolto todinho em algodão e, além do leite materno, ele recebia em doses homeopáticas, a conta-gotas, uns golinhos de whisky!!!!!!!!! (Imagino que morno, que, dizem, é um santo remédio para qualquer mal!). E assim ele foi se criando, entre uma mamadinha e outra, uma gotinha de whisky para fortalecer.

Confesso que não tive coragem de perguntar se minha bisavó também tomava uns golinhos para incrementar o leite. Como a gente faz por aqui com canjica e Malzibier.

Elas continuaram. Foi isso... Daddy sempre contava. Era por isso que ele sempre tomava um whisky morno quando estava doente.

Não sei se foi pela surpresa ou se foi por que a sobremesa foi servida ou se é assim mesmo que a gente conversa, pulando de assunto em assunto sem muita perseverança, mas o fato é que,  de repente não estávamos mais falando nem de vovô, nem de whisky e nem de tratamentos para prematuros britânicos do fim do século XIX. Nada disso.

A conversa foi variando, variando... Assistimos à novela da tarde... Fofocamos sobre os artistas da TV... Criticamos nossos atletas... Queremos mais medalhas olímpicas!!!!

De vez em quando, ficávamos quietas. Um silêncio gostoso. Íntimo. Pedacinhos de assuntos se misturando... Meu joelho tá doendo... Fui ao teatro outro dia... Tem notícias de fulana?

E assim a tarde foi passando. Eu entre elas. Aconchegada. Como em um colo imenso e macio. Me sentindo tão bem. Tão segura. Como naquelas tardes de chuva, nós bem crianças vendo televisão, enquanto os adultos conversavam na copa. Ou, então, talvez, um aconchego morninho como o que o meu avô sentia lá deitado na caixinha, envolto em algodão! Sei lá... Tão bom...

Pra falar bem a verdade, só faltou uma coisa para a tarde ficar perfeita... Talvez uma dosezinha de whisky. Uma dosezinha só. (Aí, era o paraíso!). Mas, elas preferiram um chazinho...

(in pblower-vistadelvila.blogspot.com)